terça-feira, 29 de março de 2016

Por esta casa onde eu vivo há duas fucking dúzias de anos já passaram muitos meninos e muitas meninas. Estas paredes já me viram chorar Fredericos, Danieis, Gustávos, Joões, Paulos, Martas, Ritas, Tatianas. Amanhã as minhas paredes despedem-se de mais alguém.
Não sei se me apanhaste, és esperta o suficiente para o fazer, mas duvido que te tenhas dado ao trabalho. Se me estás a ler então já não me apanhas, mas se me vais ler ainda então ficas já a saber.
Não posso fazer isto, estou a enganar-me a mim própria e a adiar o inevitável. Ambas sabemos que isto não vai a lado nenhum, e enquanto para ti está tudo bem, eu sinto que engoli uma garrafa de ácido.
Deixo-me ir outra e outra vez numa mistura inebriante do teu toque e do teu cheiro mas sei, algures nos confins de mim, que é apenas a memória olfactiva que espoleta tudo isto.
Convenço-me, ou tento, de que não estou nem nunca estive verdadeiramente apaixonada por ti e que na verdade é tudo manha do Paco.
Espero que dure até amanhã, que os meus pés não congelem durante a noite e que a minha vagina me perdoe.

sábado, 5 de março de 2016

Cada vez que iniciamos uma nova relação demoramos algum tempo a acostumar-nos, a habituar-mo-nos ao novo toque, ao novo beijo, ao novo cheiro.
Mas desta vez há algo de estranhamente familiar que senti logo a primeira vez que a minha pele tocou na dela: uma familiarização que me indica que estamos simplesmente a pegar onde nos tínhamos deixado apesar de nunca antes nos termos visto.
E como puxada pelo mais poderoso íman de toda a história do universo beijo-a, bebo-a, como se de um hábito antigo se tratasse.
E apesar de todos os travões que lhe tentamos e tentaram colocar, as mãos suadas e o frio na barriga dirigiram-nos nesta direcção absolutamente inegável.
E apesar de algo algures nos confins de nós próprias nos ter eventualmente repelido, facilmente percebemos que era essa exactamente a razão pela qual não deveríamos nunca, nunca mais apartar-nos, fosse como fosse.
E nunca um 'amo-te' me tinha sido tão subtilmente arrancado, leve como um suspiro, tão verdade que nem todas as minhas forças foram capazes de o conter.
Não sei onde é que isto vai finalmente terminar, mas não pude deixar de me atirar de cabeça, tal como ela, pois oportunidades destas só nos são tão naturalmente oferecidas uma vez na vida.